sábado, 15 de janeiro de 2011

Posfácio 2 - "What scientific concept would improve everybody's cognitive toolkit?"

A Edge Foundation publicou (creio que ontem) a "Edge Question 2011", formulada como no título acima. Volto a reabrir momentaneamente este blogue para daqui reenviar para: http://www.edge.org/q2011/q11_1.html.
Pois o âmbito deste blogue situa-se no horizonte aberto entre a expectativa de P. Snow e a do próprio John Brockman que a refere no menu "About Edge" (http://www.edge.org/about_edge.html): "In a second edition of The Two Cultures, published in 1963, Snow added a new essay, "The Two Cultures: A Second Look," in which he optimistically suggested that a new culture, a "third culture," would emerge and close the communications gap between the literary intellectuals and the scientists. In Snow's third culture, the literary intellectuals would be on speaking terms with the scientists. Although I borrow Snow's phrase, it does not describe the third culture he predicted. Literary intellectuals are not communicating with scientists. Scientists are communicating directly with the general public. Traditional intellectual media played a vertical game: journalists wrote up and professors wrote down. Today, third- culture thinkers tend to avoid the middleman and endeavor to express their deepest thoughts in a manner accessible to the intelligent reading public."
Cf. Da crise das humanidades e do seu desafio,...

domingo, 7 de novembro de 2010

Posfácio - Na semana da assunção duma 4ª globalização...

séc. XV - 1ª globalização: expansão marítima europeia (Portugal e Espanha); triângulo comercial Europa (artefactos), África (escravos), Américas (matérias primas); emersão dos Estados europeus e secundarização das instituições supranacionais (Sacro-Império e Igreja). O mundo torna-se 1 só... sob a regra europeia.
1850 - 2ª globalização: Revolução Industrial europeia; alianças cruzadas entre os Estados europeus, que partilham a África, Índia, Sudeste Asiático, e forçam a abertura dos mercados japonês e chinês (Tratado de Nanquim, 1842).
1950 - 3ª globalização: o mundo é ordenado segundo dois blocos ocidentais (democracias capitalistas vs. regimes comunistas), num jogo enquadrado por organizações supranacionais (como a CEE e a EFTA na Europa, ou o FMI para auxiliar Estados em crises financeiras); III Revolução Industrial (robotização, informatização, telecomunicações) e supremacia de grandes empresas internacionais, durante a descolonização pelos europeus. O mundo mantém-se 1 só... na tensão entre 2 regras ocidentais.
1989/91 - prolongamento do jogo: colapso do bloco comunista, mantém-se a ordenação mundial segundo a regra do bloco sobrevivente (emersão dos "tigres do Pacífico", China adere ao GATT...).
Novembro de 2010 - 4ª globalização? Perante a crise económico-financeira dos EUA e maioria dos países europeus, o novo maior exportador mundial, e também o Estado com as maiores reservas financeiras do mundo, a China, depois de crescentemente substituir os Estados europeus em África, intervém na Europa comprando dívida pública dos Estados europeus em maiores dificuldades e investindo nas suas economias (ex. compra de parte do BCP). 2 novidades: a) insuficiência das organizações supranacionais de matriz ocidental na resposta à crise, a China intervém directamente sem cuidar de ascender segundo as anteriores regras do jogo mundial; b) a salvação é extra-europeia, extra-ocidental. E "quem dá o pão, dá o pau".

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Globalização e: economia ou teologia?...

Max Stackhouse escreveu que "the kind of faith one has makes a great deal of difference in social, cultural, political and economic life — indeed, to the basic contours of civilization" (v. http://www.theglobalist.com/StoryId.aspx?StoryId=8381 - na 1ª de 5 partes dum ensaio que deverá continuar a ser publicado nesse sítio. Deixo-o aqui assinalado precisamente numa sugestão de prosseguimento de leitura.
Mas entretanto com esta nota: propõe o autor que a actual conjuntura civilizacional, a globalização do mundo, não seja pensada estritamente em parâmetros económicos - os factores gerais das nossas escolhas (recursos, proveitos...) - mas antes a partir do estabelecimento dos valores em função dos quais se ponderam proveitos, dispêndio de recursos... E a religião estará no centro desse estabelecimento. A ideia é antiga. Mas contrapõe-se-lhe a tese mais recente da ética evolucionista - cf. ex. Altruísmo e evolucionismo (2) - que, na base dum darwinismo que por sua vez se inspirou no economicismo de Adam Smith e de Malthus (demografia), proporá que as religiões é que se constituem como investimentos seleccionados ao longo da evolução da nossa espécie, por se revelarem proveitosos para a sobrevivência humana (visto estimularem a entreajuda, animarem-nos face à morte, etc.).
Ficam pois as questões, respectivamente de 1ª e de 2ª ordem: ) É a economia que deve ser pensada na base da religião, para então se interpretar e intervir no actual mundo globalizado, ou, ao contrário, a religião é que deve ser pensada economicistamente, e depois o mundo pensado em conformidade? ) Qual será o critério para decidir a anterior contenda teórica?

domingo, 4 de abril de 2010

Da influência das minorias sobre as maiorias - o ex. da Seara Nova

A tarefa de organizar uma colecção da Seara Nova - que me sugeriu 4 posts recentes - levou-me a comentar com um amigo quão frustrado terá sido afinal o esforço de tantos que durante décadas mantiveram essa revista! E o que isso sugere sobre actuais projectos de intervenção cultural...
Com efeito, desde a I República (em Portugal) e passando pelo Estado Novo, dezenas de autores com obra nas humanidades, nas ciências sociais, e nas ciências naturais mais a matemática, tendo ainda o cuidado de estabelecer transdisciplinaridades e de destacar interdisciplinaridades, participaram naquela revista, durante muitos anos publicada semanalmente, com o intuito não só de informar, mas ainda de convocar e treinar a leitura crítica das elites portuguesas - "Elite" significa aí os que tinham acesso à informação e à respectiva reflexão, e que também por isso tendiam a ocupar os cargos públicos de maior responsabilidade. Além dessa participação, todos eles mantinham a sua produção e o seu magistério em academias, institutos, outras publicações, etc. Posso referir, noutro exemplo além daqueles 4, o médico e investigador Abel Salazar, expulso do ensino em 1935 pela sua oposição ao regime autoritário, e que a 15/04/1937 correspondeu ao convite de António Sérgio para que colaborasse com a S.N. com o artigo, não de medicina mas de filosofia, "Pensamento lógico, pré-lógico, pseudo-lógico e psicológico. Pensamento emotivo, pensamento lógico e empiro-lógico" (Ano XVII, Nº 505: 3-7), numa contribuição para a divulgação em Portugal das obras do Círculo de Viena! (Tenho que colocar um "!" pois creio que só talvez há uma dúzia e meia de anos essa linha  de pensamento se terá começado a enraizar neste país).
Mas esta frustração do esforço de Abel Salazar bem poderá representar a de todos os seareiros. Pois o que, objectivamente, eles conseguiram foi formar a geração que, tendo recebido o poder político (e económico-social) daquele grupo de oficiais de carreira de patente intermédia que em 1974 se recusaram a continuar a combater em África uma vez que lhes foram equiparados os oficiais milicianos, e apesar da CEE e da UE, da ausência de catástrofes e guerras... trouxe o país até este limiar de A próxima década portuguesa - II. Tanto esforço de cultivar uma massa crítica que transformasse o país... e o resultado foi este! Valeu a pena? Não teriam todos eles melhor para fazer, quer intimamente para cada qual quer para os respectivos círculos próximos, do que gastar o seu tempo e energia numa educação cujos frutos afinal foram estes?...
Em Da influência cultural e da retórica... mas também... alinhavei algumas referências mais ou menos soltas sobre a influência das minorias sobre as maiorias. O exemplo dos seareiros parece sugerir que a expectativa sobre uma ocidentalização cultural dos portugueses (e lusófonos?) deva ser reduzidíssima... Só vislumbro 1 saída para esta sugestão: na minha passagem de olhos sobre os índices dos Nºs da referida colecção não dei conta de sinais duma ênfase estratégica na detecção, e resposta ao núcleo da resistência da maioria à influência implementada - como Howard Gardner recomenda. Será essa a pista que lhes faltou, ou, definitivamente, o pathos lusitano não é tocável pela retórica ocidentalizante?...

sábado, 3 de abril de 2010

E em correlação a Every Time We Say Goodbye...

Da guerra e da paz. O Tolstói de José Marinho - Seara Nova, 4/4

O outro Nº da Seara Nova que me ocorreu trazer aqui foi o 802, de 26 de Dezembro de 1942. Mais do que a propósito, saiu precisamente naqueles dias em que o VI exército alemão ficou cercado em Estalinegrado, e se começou a inverter a sorte da guerra. De duas outras guerras trata o artigo do filósofo português José Marinho naquele Nº dessa excelente revista, "Tolstoi e «Guerra e Paz»", pp. 83-85. Por mim (felizmente sem o pretexto doutra grande guerra), até no adjectivo de Marinho à arte do escritor russo é mais uma maneira de voltar a A Grande Arte - tributo a Tolstoi!
Posso já citar: "Como em toda a grande arte, a finalidade aqui não é a de nos ensinar qualquer coisa acerca do que se passou (...), mas simbolizar, num momento particularmente adequado para tal, a existência do homem em todos os seus múltiplos aspectos. Nem falta a este ponto uma subtil ironia quando o autor nos mostra que na paz se trava entre os homens e dentro de cada homem uma guerra não menos dolorosa, embora menos sangrenta, quando nos mostra, por outro lado, que no meio das dores e das atrocidades da guerra podem certos homens, num breve instante, abrir suas almas ao sentido daquela verdadeira e sublime serenidade em que tudo se compreende (...)" (p. 85). Se se logra apresentar o universal no singular, essa será então a "grande arte". Que neste caso nos dá conta de duas guerras: a sangrenta, entre comunidades, que normalmente ostenta esse nome... e que se constitui como um momento particularmente adequado para se apresentar uma outra guerra, esta sem sangue, entre quaisquer homens - mas especificamente no seio da mesma comunidade! - na antecâmara da que se trava no interior de cada homem.
E sobre esta última julga o nosso intérprete (3 parágrafos acima) que "propõe o romancista todo o seu tema. Os humanos vivem mesquinha e contraditoriamente a paz, e a guerra resulta de uma tentativa de escapar a essa mesquinhez e contradição. Mas a guerra, por seu turno, desnuda todo o absurdo, toda a miséria, toda a crueldade do homem. E dessa experiência regressa ele não menos desiludido, ao mesmo que antes fora". "Neste sentido se pode acrescentar que poucas obras existem tão profundamente pessimistas como Guerra e Paz" (p. 84). José Marinho reforça este juízo com a contraposição de Natacha e de Nicolau Rostov aos irmãos príncipes Maria e André, uma vez que os dramas interiores destes últimos não podem aspirar a melhor resultado do que a vida banal a que os 1ºs chegam sem maior esforço... Neste ponto, tanto quanto recordo a minha leitura adolescente - mas quanto ela me marcou! - dessa grande obra, mais o que a minha mulher me foi apontando quando a leu há poucos anos, não concordo com José Marinho. Ao contrário, há uma esperança, mas ela é custosa e, principalmente, diferente da que se visa no início (e durante quase todo o) percurso que a cumpre: tanto Natacha quanto o amigo de sempre com quem acaba por casar, Pedro, terminam pelo menos em parte libertos das fantasias e impulsos que os dominavam. Uma e outro não alcançam a densidade interior de Maria e de André, é certo, mas ao menos ultrapassam a tonteria em que viviam. E esta sua resolução interior faculta-lhes comportamentos mais produtivos, menos facilitadores da destruição, do que os comportamentos para que antes por si mesmos eram arrastados.
Essa processualidade que se constitui por pequenos nadas, mas que em cada passo a podem reorientar, parece-me aliás ficar reforçada com a teorização que Tolstói desenvolve nessa própria obra sobre a história à luz do, ou em analogia ao cálculo infinitesimal matemático (- hei-de lembrar-me de aqui voltar noutro dia).
Por agora termino com 2 apontamentos: 1) Também José Marinho ficou marcado pelo que a mim me impressiona nessa mundividência russa de Guerra e Paz ao Doutor Jivago: "pode comparar-se proveitosamente com o D. Quixote, de que dá, de múltiplas maneiras, visão e forma estética contrapolar. Na mais alta criação do génio ibérico, há uma personagem central simbólica em relação à qual toda a acção decorre e se ordena. Na mais vasta criação do génio eslavo, é impossível encontrar personagem simbólica adunadora, uma dessas figuras plenamente individualizadas das quais todo o essencial provém e a que tudo, em última análise, se refere" (p. 83). Ainda que o mais a que D. Quixote chega, acrescento eu, está mesmo muito próximo do que Marinho reconhece em Natacha...
2) "Ainda hoje muitos homens pensam na Europa e fora dela (...) que o Renascimento e tudo quanto se lhe seguiu significam a definitiva libertação do homem das ilusões místicas, (...). Ora toda a grande arte, e este é o significado da obra de Tolstoi, especialmente de Guerra e Paz, sugere que, concebido nos termos em que o vemos, tal desígnio leva os homens à imbecil satisfação e à certa perda" (p. 84). Na maior parte do ensaio que dá o nome a este blogue - e portanto nas entrelinhas da maioria destes posts - o que tenho andado a procurar sugerir não é mais do que isso... Assim eu o tivesse sabido dizer com a grande arte de José Marinho!

terça-feira, 30 de março de 2010

Outro 2 em 1 !

Cole Porter, Every time we say goodbye + John Coltrane