sexta-feira, 27 de novembro de 2009

De Damasco - em 1ª mão

O meu primo João Luís S. Albergaria enviou-me há dias um mail que me parece muito sugestivo sobre o mundo árabe, e as nossas relações com este. Aliás talvez não apenas árabe, mas muçulmano... como a Turquia, o Irão e o Afeganistão, a Indonésia, etc. Lembrando, como ele diz, que "uma coisa é ler livros e ver noticiários, outra é ver com os nossos olhos, ouvir em 1ª mão, olhar olhos nos olhos esta gente, toda ela", aqui fica esta experiência, limitada como todas as de 1ª mão (que não alcançam a visão global da que decorre de leituras), mas tão imediata ou directa quanto é possível. Aqui fica em especial à atenção de todos os progressistas que à fórmula, tendencialmente essencialista, duma "guerra entre civilizações" opõem a fórmula "guerra nas civilizações" (v. O Nó do Problema Ocidental - A dimensão das ciências, parág. 1.1)


"(...) Estou em Damasco (...) Como há muito tempo não aprendia uma língua, estou muito enferrujado... e fui logo começar pelo árabe! Não por gosto, mas por obrigação, tornava-se incompatível viver aqui sem falar alguma coisa, frases básicas, mas mesmo para isso está sendo um enorme desafio. Era e é frustrante o dia a dia sem entender nada do que dizem e com uma resistência visceral ao inglês, estes sírios recebem-nos como se fossemos todos invasores, versão moderna das cruzadas e pensam que todos os europeus falam inglês como 1ª língua,... até para aqueles que sabem que existem muitos idiomas, emocionalmente somos uma espécie de representantes do império do mal. A América é inimiga declarada! E por isso o inglês é um mau começo para qualquer aproximação, a não ser para consumir ou no mundo do jet-set. Na Jordânia, onde já estive uns 10 dias, não é tanto assim.
(...) O Árabe Standard - nas ruas falam uma versão simplificada (que estou a aprender agora) e que difere de país para país... chamam-no "amia", o do Egipto é distinto do da Síria, da Argélia, etc., mas Arabe standard é o que dá estrutura a essas variantes (...).
Arranjei um apartamento pequeno só para mim, pois já estava farto de partilhar espaços com outros. Privacidade é um conceito distinto para estes tipos... o choque cultural é tão grande ou maior do que para a Índia, mas com a diferença que os indianos são tolerantes e estes tipos - os árabes em geral (...) são dogmáticos até dizer basta (...).
A Índia - a Índia que eu vivi - a sua filosofia, religião e carácter deu-me muito mas também deixou-me uma grande dose de "self-indulgement"... e a comunidade de yoga, um discurso demasiado mole e soft. Bom, isto aqui - Médio Oriente, não é para homens "softs"... esta é uma realidade dura, a guerra e a ameaça à sua integridade física e territorial estão sempre presentes e é também por isso que o homem tem um papel totalmente superior ao da mulher, na sociedade.
Sair daqui para o pais vizinho e voltar aqui é uma deslocação legalmente proibida pela Síria. (...) Do ponto de vista intelectual e humano, é fascinante lidar, sentir de perto esta luta civilizacional que se trava por e naquele território (...). Uma coisa é ler livros e ver noticiários, outra é ver com os nossos olhos, ouvir em 1ª mão, olhar olhos nos olhos esta gente, toda ela. É uma "guerra mundial" que é canalizada para este território, não se trata apenas da luta entre palestinianos e judeus, é muito mais do que isso... mas disso falarei no texto que tenciono fazer, exactamente para arrumar as minhas ideias e partilhar com outros.
(...) É tabu mencionar o nome de Israel, Jerusalém ou judeus e entrar nessa discussão com locais, por isso não tenho podido trocar opiniões sobre um assunto que me "fascina" o que também é frustrante!

Petra foi bonito, mas pura diversão. Todavia, e mais uma vez, é daqueles sítios que por mais fotos que se tenha visto, estar lá é outra coisa... a prova do engenho humano e da sua necessidade e capacidade de se ultrapassar... num cenário natural incrível.
(...)"

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