quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Ciência, ética, e embaraços

Ao pesquisar no Google "XIII Conferência do Equinócio" encontrei várias entradas na comunicação social sobre a recente argumentação de Lewis Wolpert, no IPATIMUP, a favor da autonomia da ciência em relação à ética. Ainda bem, pois se já havia mais vida para além do anterior deficit orçamental, também a há para além do actual, e da dívida pública, das escutas, da crise do Sporting!...
Numa palavra, esse biólogo britânico, apesar de trabalhar em função da aplicação médica, terá pressuposto (ou porventura mesmo sustentado explicitamente) a distinção entre as chamadas investigação fundamental, ou pura, e a aplicada, para em seguida defender que a 1ª deve decorrer à revelia das consequências da 2ª.
Sobre aquela distinção, veio a propósito o post Na base estão as ideias - o caso Anaximandro , assinalando que mais depressa são as nossas percepções orientadas e enquadradas por ideias, do que são estas a meramente expressarem aquelas. Mas a tese central da conferência é mais problemática do que, segundo as notícias, aquele biólogo talvez tenha dado conta, ou mesmo do que a qualquer um, creio, seria possível resolver em 45 minutos.
Eu nem em 10 vezes mais tempo a saberia resolver hoje... em todo o caso dediquei-lhe toda a longa nota 19 de O Nó do Problema Ocidental - A dimensão das ciências, para ao menos balizar em alguma medida a problemática ética actual de que tenho conhecimento. Da qual, naquela conferência, terá sido novamente discutida a oposição entre consequencialismo e não consequencialismo. A 1ª posição sustenta, argumentadamente (!), que o valor ético das nossas escolhas e correlativos comportamentos se  afere em função de princípios (ex. mentir é mau, ponto final parágrafo). A 2ª posição argumenta (!) pelo contrário que aquele valor é uma função do valor que se atribua aos resultados de tais comportamentos (ex. as mentiras piedosas são boas (... quando é que uma mentira é "piedosa"?)).
O sentido dos meus pontos de exclamação anteriores é que, (já agora) se há mais investigação para além da aplicada, há também mais investigação para além da fundamental biológica, química, bem como sociológica, etc. O simples facto de se apresentarem mais do que uma posição ética obriga a 1 de 2 coisas: ou bem que se escolhe por moeda ao ar, e não vale a pena ir ao respeitável IPATIMUP gastar tempo com tais questões, anuncia-se de vez as investigações científicas que se está a desenvolver em conformidade à cara ou coroa que tenha saído, e segue-se para o almoço de convívio. Ou bem que se pretende discutir a questão, mas neste caso, depois do salto da investigação aplicada à fundamental, é necessário dar o salto desta à filosofia (neste caso à ética). E tal como os conceitos, mais ainda os procedimentos argumentativos do 2º patamar, não são exactamente os mesmos do 1º, requerendo-se uma adaptação àqueles que derem esse salto, outra adaptação se requer a quem der o 2º salto. Não tenho informação sobre se Wolpert a implementou, mas a capacidade de comunicar e de adiantar alguma coisa, por pequena que seja, em todas essas investigações depende de tais ajustes.

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