quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Dólar fraco... ou o sol na eira, que queima o nabal

O Nobel de economia Paul Krugman tem vindo a alertar no seu blog (aqui referido ao lado) contra um dogma do dólar forte e como moeda de referência internacional - v. http://krugman.blogs.nytimes.com/2009/10/09/beware-the-dollar-hawks/. Considerando até alguns comentários que têm sido feitos a posts como esse, uma política monetária norte-americana que aceite alguma desvalorização dessa moeda apoiaria as exportações e travaria as importações dos EUA, ajudando a resolver o deficit comercial desse país. Resta saber se o sol que assim secaria este deficit não queimaria ao lado algum nabal maior ainda.
Pergunto-me isto por me lembrar de números como: "Entre 1990 e 2000, o deficit comercial americano passou de 100 para 450 mil milhões de dólares". "O excedente da balança comercial americana em relação aos bens de tecnologia avançada passou de 35 mil milhões de dólares em 1990 para 5 mil milhões em 2001, e esta era deficitária em Janeiro de 2002. (...) Nas vésperas da depressão de 1929, 44,5% da produção industrial mundial encontrava-se nos Estados Unidos (...). Setenta anos mais tarde, o produto industrial americano é um pouco inferior ao da União Europeia e ligeiramente superior ao do Japão. Esta queda de poder económico não é compensada pela actividade das multinacionais americanas." - in: Emmanuel Todd, Após o Império - Ensaio sobre a decomposição do sistema americano, Lisboa: Edições 70, 2002, pp. 25, 74. Como o autor explica na frase seguinte àquela 1ª, "para equilibrar as suas contas externas, a América precisa de um afluxo de capitais de montante equivalente" (op.cit.: 25). Mas esse afluxo continuará se para os outros países deixar de ser interessante garantir reservas em dólares, uma vez que esta moeda perca o seu estatuto referencial internacional (nomeadamente no negócio do petróleo), e se os juros da banca americana forem inferiores ao de outras regiões económicas?...
Apostar numa política monetária que trave as importações e incremente as exportações pressupõe que a economia norte-americana está apta a, de um lado, responder à procura interna, e, do outro lado, marcar pontos na competição internacional. A evolução daqueles números sugere precisamente o contrário. Não conheço estatísticas mais recentes, mas foi público que a Administração Bush deixou esse país com um enorme deficit comercial (além do orçamental), logo provavelmente não houve aí qualquer inflexão. Naturalmente não será impossível que esta aconteça... mas a médio ou longo prazo, uma vez que se inflictam políticas que possam dificultar isso, e que (isto será o mais decisivo) a sociedade americana volte a ser capaz de aceitar poupar no que tem importado, e de produzir o que tiver procura internacional. Sem ser economista, arrisco-me a desconfiar que sem esta inflexão de capacidades sociais não valerão de grande coisa tanto a política monetária dos falcões criticados por Krugman, quanto a alternativa. E aquele que tem sido o centro político do Ocidente (os EUA) continuará a depreciar-se economicamente.

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